quarta-feira, 25 de março de 2009

Banheiro Privativo

De todas as funções que o banheiro pode ter, a melhor, a mais altruísta, mais verdadeira e subjetiva é a de confidente. Afinal, quem nunca chorou em um banheiro qualquer, que aperte a primeira descarga!
Num ambiente com um excelente potencial para hostilidade, orgulhosos do mundo inteiro se desmancham em lágrimas. Tímidos das mais diferentes classes, credo ou cor soluçam baixinho (de preferência, com a porta trancada). Meninas desabafam com suas colegas de colégio, homens feitos choram de raiva por uma demissão recente ou uma promoção frustrada, adolescentes lamentam o término do namoro rasgando a foto do seu “ado” ou da “ada”.
Sem perceber, escondidos de todo mundo, as emoções passam por um processo semelhante ao do alimento(!). São deglutições tão naturais que diariamente se manifestam em expressões como “engolir a seco” ou “se borrar de medo”. E no final das contas o processo fisiológico e emocional se torna exatamente o mesmo. “Engolimos a seco” para de uma só vez expelir, chorar, desabafar. É preciso por pra fora porque senão...
Pode ser em um cantinho, aquele entre a lixeira e a privada , sentado no assento, de costas para a porta, ou simplesmente de frente para o espelho. Não importa. Em algum momento da vida, em algum lugar da cidade, por algum motivo grave ou banal você já chorou, ou ainda vai chorar naquele que um dia será único, pessoal, confidente: o Seu banheiro privativo.

12/12/08

Confrontos Supramentais

No meio da rua, um deficiente mental me parou. Fixou meus olhos e disse: ”tá tudo errado”. Eu concordei. Ele continuou. “Eu não entendo vocês. A lua e o meio fio. É tudo tão pra sempre”. Pasmei. “E vocês aí... puft.”. Do mesmo modo que surgiu em minha frente, se foi. E a cada passo que dava, tão eficientes como suas palavras, seguia na missão de catar tampinhas. Um monte delas. Depois parava e admirava os carros. O tal meio fio. A luz do poste que piscava, piscava. A lua minguante. O cheiro do churrasquinho. A música do bar. Os “talvezes” das falas ao celular. Os ambulantes se recolhendo para tomar ônibus. Tudo seguia num “pra sempre” finito, diariamente finito. E em “puft”, saí do casulo asséptico da rotina normal, apenas com a missão de enxergar a vida por olhos eficientes e, como os dele, supramentais.

24/03/09