sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Vida

Desde que abri os olhos o tempo me escapa
Desde que abri os olhos o mundo, relógio
Escassa
Ex
Como caixinhas de música, pandora

Desde que o mundo me sobreveio,
Não sobrevôo

Sigo tomando conta de um cão raivoso que não tem nome
Só ameaça

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Setembro
















Tudo é noite em setembro

Um vasto tempo de alegrias pulsantes

Em brisa fria e quente

Como o distante e o perto ao mesmo instante


É fácil viver em tempos- primavera

Como se fosse a vinda de um parente distante

Abraço quente em dia frio

E a cada dia inquieto escuro,

Clarões seduzem vazios


Esses sorrisos- drops

Esses remendos de xita

Colorem minha pele lua

Num passar de dias simples, doce.


Recolorindo o tempo perdido

Envergando- me a suaves ventos

Anoitecendo

Setembriando

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Cansaço

Seria um colar de contas partido ao chão?

Seria um ciclista magro, subindo a ladeira, assobiando uma canção?

Seria a cárie, a otite antes de dormir?

Seriam os calos, as dores nas pernas, as rugas, o faz-me-rir?

Seria o fio de cabelo, grisalho e encaracolado em minha sopa?

Seria a mesma sopa, fria, sem graça, sem sal?

Seriam as hérnias, os discos, os CDs, e tal e coisa e coisa e tal?

Seria o PC reiniciando, a goteira, o relógio quebrado em dez para as três?

Seria o bebê acordando às quatro e cinqüenta e seis?

Seria o cansaço de aço, do dia, da festa, da lida, da vida?

Seria a vida?

Se for, me canso até cansar.

Vento

Parecia ser mais uma daquelas tardes. Eu, a caminho do trabalho, barriga cheia, empanzinada daquele sono de depois do almoço. Na estrada, um coletivo e eu na janela, para refrescar as sensações. Começo minha leitura, minha melhor sobremesa. Embebida nas palavras doces de minha poesia predileta. E enquanto casa e pessoas passavam, sentia a vida sem pressa, calma, mas foi impossível continuar. Quando dei por mim, ele, indiscreto e impiedoso, me interrompeu acabando com todas as aquelas degustações.
Ele, um vento safado, ladrão. Carregou em seus braços cada um dos papéis. E aquelas rimas e métricas foram substituídas por uma lírica fresca, silenciosa. Uma maré de vento norte, levando ao sul um universozinho, meu universozinho. No balanço de minhas argolas, meu instante de existência ventava. Minhas palavras, meus silêncios, minhas contas a pagar, meu futuro de ai-meu-Deus. E ele, já não tão inconvenientemente, sorria de pirraça. Num discurso engraçado, amistoso. Não pude resistir. Daquela janela aberta, abri um sorriso infantil. Uma resposta sem palavras, um riso cúmplice. Cócegas que não paravam de ventar em minha barriga, agora, cheinha de felicidade. Um riso passava por mim e ventava as outras faces, do corredor às janelas, da frente a fora. A caminho do trabalho meus lábios secavam, e ele, o vento, beijava minhas emoções. Desmanchei-me em mais puro ar. Antes mesmo que chegasse minha parada, defenestrei brisamente. A vida é gratuita - ventaniei.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Irresponsavelmente Amigos




Pra muita gente, amizade é um contrato. Daqueles assinados e devidamente autenticados por ambas (ou mais) partes. Protocolado, com data e hora marcada. Escrevente, testemunha, senha e tantas outras responsabilidades.
Pra mim não. Pra mim amizade é descompromisso. Isso mesmo. O descompromisso inadiável de ser eu mesmo, sem esquecer de me despreocupar com o que vão pensar de mim... Irresponsabilidade com os meus próprios interesses. Um caos da sorte. Um acaso inevitável.
A gente se bate, se esbarra, se encanta e fica. Vai ficando em um bilhetinho passado em sala de aula. Cheio de erros ortografico e palavras reduzid. Que vai e volta, sem testemunhas oculares- ainda mais se uma delas for ele: o professor.
Amizade é papel sim... Mas é aquele papel de fundo de caderno, rabiscado e espontâneo. É papel de bala IceKiss esquecido na bolsa. Papel de pão com o número do telefone que, se por acaso se perder, vamos fazer de tudo pra reencontrar.
Tá aí! Amizade é reencontro. É reunião marcada (só um pouquinho de previsibilidade senão a reunião nunca acontece), mas sempre cheia de improvisos. Um reencontro que pra acontecer pode passar por um suporte virtual. E aí que ela se manifesta em emails radiantes e mágicos. Abre-se e num instante somos invadidos por contagiantes e caóticas cócegas do além.
Enfim... amizade é um instante na biblioteca e noutro olhando um pôr-do-sol qualquer. Ao acaso. Sempre juntos. Apenas curtindo a doce irresponsabilidade de ser nós mesmos.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Poema azul


Olhos de água no horizonte
dançam ao som de poesia
desmancho- me em chuva
na diversão do seu sorriso alado
na metafísica do seu jeans rasgado
no farfalhar do embrulho de aniversário

Nesse poema de ideias refrescantes
não sei se de lágrimas ou de desejos dilatantes
rumores de um futuro granulado
de um passado desbotado
dessa calma
dessas lembranças leves como borboleta,
rascunho mil desejos

quero a paz dos amores mórbidos
e o fogo das paixões repentinas
quero um pouco de tudo que abrange teu ser
quero ter e ser ao mesmo tempo nada
quero te encontrar na dimensão absurda do existir

Quero a leve entonação do grave de tua voz
Baixinho em mi
A prontidão e a preguiça
A incoerência e uma cabeça cheia de razões
Tudo à máxima potência

E na vastidão do teu blues
Caminhar descalça, deslizando em gelo seco
Queimando, refrescando
Em uma sensação única como esse poema
Como esse poema azul

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Frio

Em floresta de mim, caminhemos por suaves trilhas.
Na subida encontrarás cavernas de tensão e desejo.
E o sabor de engasgo, ar rarefeito de angústias.

Caminhemos em florestais tais.
Ao céu as douradas nuvens em puro veludo.
Ao chão, as doces lembranças que não voam mais.

Nem verde, nem carinhos verás.
Só passadinhos rastejando entre nossos pés.
Meia volta em volta, e as velhas certezas pastosas
Em uma massa de dúvidas, macias, doídas.

Vais saciar sua curiosidade em cachoeiras.
Provar do sabor açucarado de minhas lágrimas.


Eis a sensação deliciosa de me ver em carne viva.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Conto do tempo

Faz de conta que sou tempo
E guardo no meu bolso
Os dias de mil glórias
Mil amores de infância
Dez espinhas na cara

Faz de conta que sou tempo
E embrulho pra presente
Tapas a orgulhosos
Rugas a vaidosos
Ilusões e cabelos caídos

Faz de conta que sou tempo
E brinco de esconde-esconde.
Escondo dias em vida
Revelo angústias em morte
Labores, lágrimas e alegrias

Faz
Faz de conta então...
E bem no final das contas feche os olhos
E me deixe, me deixe passar.

Boneca Triste

Boneca Triste resolveu olhar no espelho
Passou batom, blush, rímel, lápis
Pintou a boca e a alma de vermelho.
Boneca Triste abriu o guarda-roupa e as lembranças
Experimentou uma, duas, três peças
Deixou de lado as mais engenhosas vinganças.
Boneca Triste caminhou de salto alto
Atravessou mares e asfalto
Deixou a chuva borrar o resto de maquiagem.
Boneca Triste encontrou outras bonecas tristes.
E celebraram o chá da piedade
Com três gotinhas de lágrimas
e as mais sinceras das humanidades.
Dançaram a dança da chuva.
Fizeram minis suas saias.
Caminharam a pé de meias Lupo.
Desfilaram à la Milão.
Mas nada. Nada. Nada da tristeza passar.
A lama da rua cobriu Boneca Triste.
Longe da caixa, ela agora só lamentava.
(lama por todos os lados: nadava)
Nada, nada, nada bonequinha triste!
Mas e se todas as bonecas tristes se forem?
E quando o triste resolver deixar ser boneca? Como será?
Aí a bonequinha vai apelar
“Faço-te tudo, mas não me deixes”
O que faria sem a pena alheia?
Ou o pavor da triste partida?
O que será da boneca sem sua companhia mais sentida?
Depois do breve instante de desesperança
A tristeza se arrepende e volta pra casa
E a boneca que não encontrou a razão de ser feliz
dança, brinca, sente, insiste
A alegre notícia de voltar a ser boneca e ao mesmo tempo triste.

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Palavras na bandeja (ou Self Service)

Por sua boca sinto um novo modo de vida:
Mais leve
Mais puro
Mais consistente

Sinto sílabas em pequenas porções de veludo
Frases como povilho de desejo doce
Palavras na bandeja

Banquete de olhares
E uma vontade gustativa de perceber tudo
Tudo em você

Começo pela fala mole
Goles e goles de conversa líquida
A meia xícara de carinho bem quentinho...

Um pouquinho a cada dia:
Café, almoço, à madrugada

Você, suas palavras, suas caras
E esse restinho esfarelado de esperanças perdidas.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Adeus aluvião



Folhas pelo chão são o sinal:

a tempestade acaba de partir.

Silêncio para ouvir os passos da primavera

Sussurros para saudar as flores

Um novo dia que acaba de surgir.



Fiz travesseiro das folhas pisadas

Carreguei um mundo de sensações

Levei o peso das gotas de chuva,

A leveza do caos e ilusões



Nesse entretudo, catei folhas e sorrisos,

Sorvi palavras em silêncios de temporal

Olhares sem cores

Verdades sem datas,

Histórias em espiral



Hoje, é só querer e paro tudo.

O vento com um leve toque de dedos

As nuvens com o som da respiração

Agora, não mais chuva, neve, noite, medos



Em meu travesseiro de folhas

Contemplo os dias em constelação






sexta-feira, 24 de abril de 2009

A brevidade dos pronomes líquidos






No ano passado:
-Quem?
Há 6 meses:
-Senhor,
Quatro meses atrás...
-Você!!!
Há 2 meses:
-Mô!
Há algumas semanas:
-Mô...
Dois dias atrás:
-Você.
Hoje de manhã:
-Quem?!


10/12/08

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Psicologia Inversa. Ou pensamento positivo.






Não sei fazer poesia

Não sei fazer

Não sei

Não

Não sei fazer poesia

Não sei fazer poesia

Não sei

Fazer.

Não

sei

não.

Xiiiii.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Paixões

Uma paixão acaba de balançar meu corpo.
E nina e sacode cada osso
E rege a vida inteira. Mentecorpoalmaespiritoamém
Uma paixão que agora é déspota, carcereiro e mártir
Impõe quereres me faz obedecer à primeira voz.

A paixão que mora em mim não tem nome
Usa óculos e fala português
Ultrapassa minha idade, meu humor, minha sede, meu suor
A paixão que mora em mim se cria
Recria, desfaz, reconstrói, impõe, domina
Vem do alto, fala mais alto. Grita -sussurra
Vem de dentro, vende, dá, repassa com dez porcento de desconto

Me rasga o sono, influi em rio
Infusa, difunde, implode, explode... ex? Nunca.
Atual como a vida,
Atual como as palavras,
Trasborda as convenções

Em corpo, dança
Em estado, líquido
Em espírito, voa
Em vida, se perde sem nome, sem causa, sem meias palavras.

quarta-feira, 25 de março de 2009

Banheiro Privativo

De todas as funções que o banheiro pode ter, a melhor, a mais altruísta, mais verdadeira e subjetiva é a de confidente. Afinal, quem nunca chorou em um banheiro qualquer, que aperte a primeira descarga!
Num ambiente com um excelente potencial para hostilidade, orgulhosos do mundo inteiro se desmancham em lágrimas. Tímidos das mais diferentes classes, credo ou cor soluçam baixinho (de preferência, com a porta trancada). Meninas desabafam com suas colegas de colégio, homens feitos choram de raiva por uma demissão recente ou uma promoção frustrada, adolescentes lamentam o término do namoro rasgando a foto do seu “ado” ou da “ada”.
Sem perceber, escondidos de todo mundo, as emoções passam por um processo semelhante ao do alimento(!). São deglutições tão naturais que diariamente se manifestam em expressões como “engolir a seco” ou “se borrar de medo”. E no final das contas o processo fisiológico e emocional se torna exatamente o mesmo. “Engolimos a seco” para de uma só vez expelir, chorar, desabafar. É preciso por pra fora porque senão...
Pode ser em um cantinho, aquele entre a lixeira e a privada , sentado no assento, de costas para a porta, ou simplesmente de frente para o espelho. Não importa. Em algum momento da vida, em algum lugar da cidade, por algum motivo grave ou banal você já chorou, ou ainda vai chorar naquele que um dia será único, pessoal, confidente: o Seu banheiro privativo.

12/12/08

Confrontos Supramentais

No meio da rua, um deficiente mental me parou. Fixou meus olhos e disse: ”tá tudo errado”. Eu concordei. Ele continuou. “Eu não entendo vocês. A lua e o meio fio. É tudo tão pra sempre”. Pasmei. “E vocês aí... puft.”. Do mesmo modo que surgiu em minha frente, se foi. E a cada passo que dava, tão eficientes como suas palavras, seguia na missão de catar tampinhas. Um monte delas. Depois parava e admirava os carros. O tal meio fio. A luz do poste que piscava, piscava. A lua minguante. O cheiro do churrasquinho. A música do bar. Os “talvezes” das falas ao celular. Os ambulantes se recolhendo para tomar ônibus. Tudo seguia num “pra sempre” finito, diariamente finito. E em “puft”, saí do casulo asséptico da rotina normal, apenas com a missão de enxergar a vida por olhos eficientes e, como os dele, supramentais.

24/03/09